31.12.05

Uma luz pardacenta

Um vento cortante saía pelas frinchas da porta e por um vidro meio quebrado de uma das poucas janelas. Em frente a mim uma mulher de idade infinitamente antiga dormitava, anichando ao peito um saco de pano do qual emergia, altiva, a cabeça de um galo. Imperial, os olhos amarelos de desdém, fitava-me, como num desafio. Em frente a nós, comboios jiboiantes, de mercadorias, em horário nocturno, cruzavam-se sem parar. Tudo parecia como nos confins do mundo. Entráramos para ali pelas quatro e meia da tarde e já era noite. O livro que tentara ler, há muito o esquecera, cego por uma luz pardacenta de suja, que mal nos alumiava. Faltava apenas chegar, atrasada sem se saber quanto, a automotora que nos tiraria para destinos mais gelados, mais incógnitos do que até aqui.