28.11.06

Um anseio de vida


Encontrei-a, amarelecida, esta fotografia. São os que me deram o ser. Ao microfone o meu pai, em frente a minha mãe. Vinte e cinco anos de idade era então apenas o que os separava. Numa insignificante salinha, emitia em onda curta, com dez watts de potência, o CR6RE, na banda dos quarenta e um metros e quarenta, na frequência dos 7 245 kilociclos. Eram os dias da rádio, os discos pedidos, tocados ainda a setenta e oito rotações. Olhando para o que a vida fez destas ondas de esperança, eu decretaria, se tal me fosse possível, o absurdo do que sucedeu. Neste final de dia, olhando para o céu a arrefecer, nocturno, tento encontrá-las, perdidas no éter, as palavras ditas a este microfone, num tempo em que a ideia de mim era apenas uma esperança de vida, um anseio de viver.