Quantas vezes eram só duas linhas, o que podia caber num simples postal. Se houvesse tempo para se pensar ia em cada letra um pensamento, em cada palavra um sentimento, em cada parágrafo um anseio. Assim era só a presença e a recordação. No «nós por cada todos bem» e no «espero que ao receber esta» estava, afinal, já tudo dito. O mais, eram as coisas ridiculamente carinhosas como o «olha lá, meu filho, não apanhes frio» ou «o pai não se esqueça de tomar seus os remédios». Amanhã, ao virar a folha de um álbum, um coração de mãe, a memória gasta pelo tempo, a sensibilidade ensarilhada pela velhice, dirá à vizinha do lado, pela milésima vez: «era este, um bonito rapaz. Escrevia-nos cartas tão lindas. Acho que ainda as tenho ali». No mais, é um mundo que já morreu.