20.8.08

Bicos de lacre

«Não te esqueças dos pássaros». Afinal era um. O outro tinha morrido. Renasceu hoje. Nada mais triste do que a incompletude. Mesmo nos pássaros, a solidão é uma forma de a vida se não cumprir.

18.8.08

Ridícula e absurda

As malas de senhora, como é sabido, não têm fundo, cabe no seu infinito túnel a imensidão do mundo e mais as chaves de casa, que são as que nunca aparecem quando surge a porta e ainda a tralha diversa dos seus acompanhantes sem mala, quando Madame tem parelha. Além disso são um artigo de toilette, tendo por isso que condizer em chic com a indumentária e o momento, algumas vezes uma arma de arremesso, nomeadamente em caso de roubo de esticão ou assédio imprudente.
Já nos homens a coisa complica-se. Desde que as pochettes passaram a chamar-se mariconeras aquela pendureza sub-axilar tornou-se ambígua, carregada de decorrências linguísticas subliminares e simbólicas.
Por assim ser, descontado o saco de plástico, atributo de reformado às compras, resta a pasta, de couro com fechos e pegas, sinal de distinção no mundo dos carregadores de problemas, justificação para a espinhela caída, forma de esconder, entre livros e dossiers, a vergonha das contas por pagar e o pudor dos versos inconfessados. Por vezes ridícula e absurda, é o que há para se enfrentar a vulgaridade transportadora.

12.8.08

E se uma noite um viajante...

Há quem sonhe com as praias do Sul, o sol dos trópicos, a exuberante flora africana e seus perigos. Há quem se imagine nas montanhas do Leste, com a lua oriental, entre a humana fauna asiática e suas doçuras. Eu não há imagem na Islândia que me não cative. Um destes anos passados, pelo Verão, um jornal trouxe um suplemento sobre rotas e destinos. Viajei até lá, folheando-o, esta madrugada regressei, com esta fotografia. Do signo Carneiro, ali estão os meus homólogos, felizes por não estarem aqui com a Finlândia como horizonte.

3.8.08

Modo de vida

Para se escrever é preciso ler; ler muito, cada vez mais alto. Um dia uma pessoa despenha-se do cimo da sua biblioteca, qual ave caída dos céus da poesia, estatelado na laje da prosa descritiva. Cá em baixo um coro de escreventes, dos que fazem da escrita modo de vida, aplaude, em cacarejo, a sorte funesta do que na escrita encontrou forma de morte.